O hambúrguer
Levado aos Estados
Unidos pelos imigrantes alemães do fim do século XIX, o bife de carne moída
logo conquistou o público americano. Depois, já sob a forma de sanduíche,
ganhou o mundo e virou um símbolo.
Disclaimer:
Essa matéria faz parte
do Arquivo da Revista Superinteressante, Rdição 7 de Abril de 1988 e pode
conter dados muito antigos que podem não condizer mais com a atualidade.
O ano é
1904. Os Estados Unidos se transformam rapidamente na maior potência industrial
do planeta. O novo século promete paz e prosperidade para os americanos.
Esse clima
de afluência e otimismo vai se refletir na feira mundial de Saint Louis,
capital do Missouri, no meio-oeste do país. Ali, multidões tomam contato pela
primeira vez com uma iguaria que trinta anos mais tarde viria a ser quase um
verdadeiro sinônimo de Estados Unidos: o hambúrguer.
O hambúrguer
descobriu a América na segunda metade do século XIX, trazido pelas levas de
imigrantes alemães embarcados no porto de Hamburgo, razão pela qual seu
primeiro nome no Novo Mundo foi hamburg steak. Era uma comida rústica. Os
primeiros a apreciá-la nos Estados Unidos foram os marinheiros que aproveitavam
a carne entre dois pedaços de pão para mastigar algo enquanto trabalhavam. Suas
origens, no entanto, podem ser encontradas no passado remoto. Durante os
séculos XII e XIII, a Europa conheceu as invasões dos chamados mongóis. Na
verdade, entre os povos que se agrupavam sob essa denomina-ção estavam os
tártaros, tribos nômades guerreiras que habitavam as estepes russas. Os tártaros
introduziram na Europa a técnica de moer a carne dura e de má qualidade para
torná-la mais digerível. Diz a lenda que os cavaleiros tártaros costumavam
levar a carne crua embaixo da sela quando galopavam em suas incursões
guerreiras. Na hora de comer, o bife tártaro já tinha se torna-do uma pasta. O
que se sabe com cer-teza é que os tártaros foram os que apresentaram o
hambúrguer aos ham-burgueses. Esses ficaram com a fama de terem sido dos do
futuro sanduíche. "Dize-me o que comes e te direi quem és", escreveu
em 1826 o gastrônomo francês Antoine Brillat-Savarin (1755-1826).
O hamburger,
de fato, deve a sua popularidade às características da sociedade que o acolheu.
A partir do início do século, as massas de trabalhadores americanos
necessitavam de algum tipo de alimento rápido, prático e barato e - adequado,
em suma, ao ritmo da explosão industrial do país.
Só faltava
inventar uma fórmula para aproveitar esse mercado em expansão. Foi fácil. Antes
ainda da Feira Mundial de Saint Louis, os americanos já conheciam o carrinho de
sorvetes e hot-dogs - a versão americana da salsicha, também trazida por
imigrantes alemães. Mas foi somente em 1921 que surgiu a primeira cadeia de
lanchonetes do país, chamada White Castle.
Vendia-se
nelas um hambúrguer cozido no vapor e cheio de cebola. O prato talvez não fosse
especialmente apetitoso, mas seu preço com certeza era: 5 centavos de dólar.
Pelo seu efeito laxativo, ganharam o apelido de "escorregarores".
As pequenas
lanchonetes da época de 20 eram apenas lugares onde os fregueses sentavam ao
balcão. Um ou dois funcionários faziam de tudo desde virar os hambúrgueres na
chapa até registrar as vendas. Muito diferentes foram os drive-ins dos anos 30.
Pátios de estacionamento grandes e de fácil acesso substituíram a pequena área
de serviço na calçada, e garçonetes em tempo integral serviam os esfomeados
motoristas. A idéia prosperou - garçonetes até foram substituídas por moças
sobre patins. Logo, os clientes faziam pedidos usando telefones em carabinas
nos estacionamentos.
Foi nessa
época que o cartunista americano Elzie Segar (1894-1938) acrescentou mais um
personagem a suas tiras do Popeye, o marinheiro que gostava de espinafre. J.
Wellington Wimpy - Pimpão, no Brasil - ficou famoso pelo seu insaciável apetite
por hambúrgueres. Uma vez, Popeye ganhou 20 mil dólares apostando que Wimpy não
agüentaria dez minutos com um hambúrguer na mão sem comê-lo. O esfomeado
personagem segurou-o por 9 minutos e 50 segundos. Em 1937, os irmãos Dick e
Maurice Mc Donald abriram um pequeno drive-in na cidade de San Bernardino na
Califórna, e revolucionaram o mundo do fast-food. Como todos os outros, eles
serviam lanches rápidos para clientes apressados. O drive-in era também o ponto
de encontro dos adolescentes da cidade. Por causa dessa clientela, os drive-ins
eram identificados como focos de confusão que afugentavam as famílias de
respeito. Para mudar essa imagem, em 1948, os irmãos Mc Donald reformularam a
loja. Sem garçonetes servindo no carro, a lanchonete perdeu parte do seu apelo
para os adolescentes mas em compensação conquistou as famílias. Logo dezenas de
pequenos empresários começavam a imitar o novo conceito de lanchonete.
A partir dos
Estados Unidos, o hambúrguer conquistou o mundo. A rodela de uns 50 gramas de
carne moída entre duas metades de pão redondo, coberta ou não de queijo,
acompanhada ou não de alface e tomate, pode ser encontrada em lugares tão
distantes entre si como a Austrália e a Áustria, a Jamaica e o Japão. É
impossível saber quantos hambúrgueres são consumidos todos os dias no planeta,
mas a rede McDonald·s calculou os que saem de suas cozinhas. O resultado é
assombroso: 12.528.000 hambúrgueres cada vez que a Terra dá uma volta completa
em redor de seu eixo ou 145 por segundo.
As
lanchonetes começaram a chegar ao Brasil em 1952, quando o tenista americano
Robert Falkemburg fundou o primeiro Bob·s em Copacabana, no Rio. Três anos mais
tarde, o empresário Flávio Galante abria em São Paulo os seus Hot-Dogs,
lanchonetes destinadas a atrair o público dos cinemas da região da rua Augusta.
Como no resto do mundo, também aqui o hambúrguer entrou para a li-nha de
montagem. Com um sistema de licenciamento que permite a proprietários de lojas
usar uma marca conhecida, desde que sigam os padrões de qualidade da firma
original, algumas lanchonetes dispõem até de computadores que programam o tempo
de duração da fritura. De acordo com as regras do Departamento de Agricultura
dos Estados Unidos, a carne de hambúrguer deve ser fresca, com até 30 por cento
de gordura.
Os
nutricionistas admitem que um hambúrguer com fritas alimenta bastante,
"mas não deve tornar-se a refeição básica de uma pessoa todos os
dias", alerta Rosemarie Andreazza, da Escola Paulista de Medicina. Myrian
Najas, da mesma escola, diz que o principal defeito dos sanduíches, como o
hambúrguer, é o próprio motivo que os tornaram tão populares. "Nas grandes
cidades, as pessoas não têm tempo nem dinheiro para se alimentar direito",
afirma Myrian. "Em vez de comer num lugar tranqüilo, mastigando com vagar,
o consumidor de sanduíche engole tudo depressa, não vê o que e nem quanto está
comendo. E por causa disso que aparecem os casos de gastrite, úlcera e até
obesidade." Mas, como todo mundo, a mesma Myrian não consegue fugir à
regra. Durante o almoço, muitas vezes apela para um hambúrguer nalanchonete
mais próxima.
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